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14 de agosto de 2025

COLOMBIANA É A PRIMEIRA NO MUNDO A PASSAR POR CIRURGIA INÉDITA PARA DEPRESSÃO CRÔNICA

 

Lorena Rodríguez, 37 anos, viveu mais de duas décadas entre crises de ansiedade e episódios depressivos. Depois de tentar inúmeros tratamentos sem sucesso duradouro, ela se tornou a primeira pessoa no mundo a passar por uma cirurgia de estimulação cerebral profunda com quatro eletrodos para reverter a depressão resistente. O procedimento foi realizado em abril, em Bogotá, pelo neurocirurgião colombiano William Contreras.

Administradora de empresas e mestre em marketing e gestão comercial, Lorena relata ao g1 que os primeiros sinais surgiram ainda na adolescência. “Era como viver por obrigação, no piloto automático. Sentia tristeza, vazio e uma ansiedade que não passava. Mesmo em momentos que deveriam ser felizes, eu não conseguia estar presente”, conta.

Com o tempo, vieram as enxaquecas e a dificuldade para executar tarefas simples, como levantar da cama. “Entendi que não era uma fase, mas uma condição clínica. Meu próprio cérebro parecia me trair.”

Resistência aos tratamentos

O diagnóstico foi de transtorno misto de ansiedade e depressão, resistente a terapias convencionais. Lorena fez uso de mais de cinco tipos de antidepressivos, ansiolíticos e estabilizadores do humor; passou por psicoterapias diversas, meditação, medicina funcional, mudanças de país e práticas espirituais. Alguns métodos trouxeram alívio temporário, mas a melhora nunca se sustentou.

Lorena e o médico, William Contreras, falaram com exclusividade ao g1. Segundo o neurocirurgião, é para casos como o dela, em que métodos convencionais já foram testados e falharam, que a estimulação cerebral profunda (DBS) é indicada.

“Quando todos os tratamentos convencionais falham, a DBS oferece modulação contínua e reversível dos circuitos cerebrais ligados ao humor e à motivação. O objetivo é ajustar a atividade elétrica dessas áreas para aliviar os sintomas”, explica Contreras.

Como é a cirurgia

A possibilidade de cirurgia surgiu por acaso. Lorena conheceu o trabalho de Contreras ao acompanhar a sobrinha em uma consulta com o neurocirurgião. Ao saber que ele também operava casos de transtornos do humor, escreveu para o médico em dezembro de 2024 e relatou seu caso.

A cirurgia consiste na implantação de eletrodos no área subgenual do córtex cingulado (SCG25) — uma região associada à tristeza profunda — e no braço anterior da cápsula interna, uma via que conecta áreas do pensamento racional a estruturas emocionais, como o núcleo accumbens.

“Usamos quatro eletrodos — dois por hemisfério — para atingir simultaneamente essas regiões. É a primeira vez no mundo que essa abordagem multitarget, direcionada a múltiplos alvos, é feita para depressão resistente”, diz.
Até a cirurgia de Lorena, não havia nenhuma publicação científica relatando procedimentos similares.

Como funciona a estimulação cerebral profunda (DBS)?

O procedimento começa com um mapeamento detalhado do cérebro, feito por exames de ressonância magnética e uma técnica chamada tractografia, que mostra como as fibras nervosas se conectam. A partir dessas imagens, os médicos identificam os pontos exatos onde será feita a estimulação.

Em seguida, são implantados eletrodos — fios muito finos — com precisão de milímetros em áreas profundas do cérebro. Esses eletrodos são ligados a um neuroestimulador, um pequeno aparelho colocado no tórax, que envia impulsos elétricos constantes para “regular” a atividade dos circuitos cerebrais.

Os resultados variam: entre 40% e 60% dos pacientes apresentam melhora significativa dos sintomas, e de 20% a 30% chegam a uma remissão duradoura, ou seja, ficam sem sinais da doença por longos períodos.

Sintomas foram base do procedimento

Lorena sabia que seria um procedimento invasivo, durante boa parte do qual precisaria ficar acordada para que os cirurgiões testassem estímulos. “Tinha medo, mas se não tentasse, estaria traindo a parte de mim que ainda acreditava na vida. Entrei no centro cirúrgico com medo, mas também com fé”, lembra.

A operação, realizada no Hospital Internacional da Colômbia, foi guiada por ressonância magnética de alta resolução e mapeamento das conexões cerebrais.

“A novidade no caso da Lorena é que realizamos uma cirurgia baseada diretamente nos sintomas. A condição dela incluía vários circuitos cerebrais: ruminação, culpa, ansiedade e tristeza — cada um envolvendo redes diferentes. Um único eletrodo por hemisfério – que é o padrão para esse tipo de cirurgia – seria insuficiente”, explica Contreras.
“Por isso, usamos quatro pequenos sensores que medem a atividade elétrica do cérebro e analisam como as áreas se conectam entre si. Assim, conseguimos ajustar a estimulação de forma personalizada para cada região envolvida.”

“No dia seguinte à cirurgia, ela me disse que sentia como se tivesse tirado um peso do peito.”

Recuperação e primeiros resultados
Nos primeiros dias, Lorena sentiu dores de cabeça e cansaço, mas também percebeu mudanças. “É como voltar a ver a luz, como se a luz estivesse entrando por frestas que antes estavam fechadas”, afirma. Os ajustes no neuroestimulador, ela e o médico afirmam, têm proporcionado momentos inéditos de estabilidade.

Operada há quatro meses, Lorena relata pequenas, mas profundas mudanças.

“Voltei a fazer planos sem medo. Ainda sou eu, mas agora tenho espaço para viver, não só resistir.”
Para Contreras, casos como o dela são um marco para a medicina latino-americana. “Mostram que temos capacidade científica e tecnológica para oferecer tratamentos de ponta sem que o paciente precise ir para fora do continente.”

Para Lorena, a cirurgia não trouxe apenas um recurso médico, mas um renascimento. “Escolhi a vida mais uma vez — e, desta vez, com esperança real.” (G1)